domingo, 25 de setembro de 2011

AMOR PRÓPRIO

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Um mendigo dos arredores de Madri esmolava nobremente. Disse-lhe um transeunte:
- O sr. não tem vergonha de se dedicar a mister tão infame, quando podia trabalhar?
- Senhor, - respondeu o pedinte - estou lhe pedindo dinheiro e não conselhos. - E com toda a dignidade castelhana virou-lhe as costas.
Era um mendigo soberbo. Um nada lhe feria a vaidade. Pedia esmola por amor de si mesmo, e por amor de si mesmo não suportava reprimendas.


Viajando pela Índia, topou um missionário com um faquir carregado de cadeias, nu como um macaco, deitado sobre o ventre e deixando-se chicotear em resgate dos pecados de seus patrícios hindus, que lhe davam algumas moedas do país.
- Que renúncia de si próprio! - dizia um dos espectadores.
- Renúncia de mim próprio? - retorquiu o faquir. - Ficai sabendo que não me deixo açoitar neste mundo senão para vos retribuir no outro. Quando fordes cavalo e eu cavaleiro.

 

Tiveram pois plena razão os que disseram ser o amor de nós mesmos a base de todos as nossas ações - na Índia, na Espanha como em toda a terra habitável.
Supérfluo é provar aos homens que têm rosto. Supérfluo também seria demonstrar-lhes possuírem amor próprio. O amor próprio é o instrumento da nossa conservação. Assemelha-se ao instrumento da perpetuação da espécie. Necessitamo-lo. É-nos caro. Deleita-nos - E cumpre ocultá-lo.

 

- Dicionario Filosofico – Voltaire

3 Requisitos para o Auto-conhecimento - Blavatsky

NARCISO

 

A primeira necessidade para obter-se conhecimento é tornar-se profundamente consciente da ignorância; sentir com cada fibra do coração que se é incessantemente auto-iludido.

O segundo requisito é a convicção ainda mais profunda de que tal conhecimento — tal conhecimento intuitivo e certo — pode ser obtido com esforço.

O terceiro e mais importante é uma indomável determinação de obter e confrontar este conhecimento.

Este auto-conhecimento não é obtido pelo que o homem usualmente chama de "auto-análise". Não é alcançado pelo raciocínio ou qualquer processo mental; pois é o despertar para a consciência da natureza Divina do homem.

Obter tal conhecimento é um feito maior do que dominar os elementos ou conhecer o futuro.

 

[Lúcifer, vol. I, no 2, outubro, 1887, p. 89]

[Autoria algo incerta, mas provavelmente de H.P.B.]

sábado, 17 de setembro de 2011

O Choro de Sansara

 

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La vem ela majestosa a dançar

Dor, sofrimento, com paços delicados

Flutuando com gestos ondulados

Como uma estrela a girar

 

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Vejo sobre uma nuvem de fumaça

Uma criança linda eternamente a girar

É Sansara, em sua louca dança

A louca dança que a todos faz chorar

 

Ela não entende, ela não irá parar

Estou preso, e ela a me amar

É o estranho amor dos deuses,

A sombra que a todos cobrirá

 

Não te querer é não te amar

Oh! Sansara o que te fará,

O que fará você parar de dançar?

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Seu giro, sua dança frenética

Nesse triste e obscuro vale

No amargo, e belo, rio de lagrima

Que todos temos que atravessar

 

Mas o que, doce menina, queres?

Deste amontoado de bizarros seres

Quem o teu poderoso circulo mágico

Poderá, romper?

 

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Por que não te querer é não te amar

Oh! Sansara o que te fará,

O que fará você parar de dançar?

 

Fr Gemini 21.’.

O que é Gnosis? Por: Samael Aun Weor

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O Autoconhecimento é a base fundamental sobre a qual se sustenta o Trabalho Esotérico Gnóstico. Vejamos o que nos diz a respeito, o filósofo contemporâneo Samael Aun Weor:

 

“Como os estudos gnósticos progrediram extraordinariamente nesses últimos tempos, nenhuma pessoa culta cairia hoje, como outrora, no erro simplista de fazer surgir as correntes gnósticas de alguma única latitude espiritual”.

 

“Embora seja certo que devamos levar em consideração em qualquer sistema gnóstico, seus elementos helenísticos orientais, incluindo Pérsia, Mesopotâmia, Síria, Índia, Palestina, Egipto, etc., nunca deveríamos ignorar os princípios gnósticos perceptíveis nos (...) Nahuas, Toltecas, Astecas, Zapotecas, Maias, Chibchas, Incas, Quéchuas, etc, da Indo América”.

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“Falando francamente e sem rodeios, diremos: “A Gnosis é uma função bastante natural da consciência, uma ‘philosophia perennis et universalis’. (...)”. “A palavra Gnosticismo encerra dentro de sua estrutura gramatical a idéia de sistemas ou correntes dedicadas ao estudo da Gnosis”. “Este Gnosticismo implica em uma série coerente, clara, precisa de elementos fundamentais verificáveis mediante a experiência mística direta. (...)”.

 

“Não é demais, neste tratado, esclarecer de forma enfática que o Gnosticismo é um processo religioso muito íntimo, natural e profundo. Esoterismo autêntico de fundo, desenvolvendo-se de instante em instante, com vivências místicas muito particulares(...)”. “Doutrina extraordinária, que fundamentalmente adopta a forma mítica e, às vezes, mitológica”.

 

“Inquestionavelmente, o conhecimento gnóstico sempre escapa às normais análises do raciocínio subjectivo”. “O correlato deste conhecimento é a intimidade infinita da pessoa, o Ser. A razão de Ser do Ser é o próprio Ser. Somente o Ser pode conhecer a si mesmo. O Ser, portanto, se autoconhece na Gnosis”. “O Ser, revalorizando-se e conhecendo a si mesmo é a autognosis; indubitavelmente esta última é, em si mesma, a Gnosis”.

 

“O Autoconhecimento do Ser é um movimento supra-racional que depende dele, que nada tem a ver com o intelectualismo”. “O abismo que existe entre o Ser e o Eu é infranqueável e, por isto, o Pneuma, o Espírito, se reconhece e este reconhecimento é um ato autônomo para o qual a razão subjectiva do mamífero intelectual é ineficaz, insuficiente, terrivelmente pobre”. “Autoconhecimento, autognosis, implica na aniquilação do Eu como trabalho prévio, urgente, inadiável”. “O Eu, o Ego, está composto por somas e subtrações de elementos subjetivos, inumanos, bestiais, que, inquestionavelmente, têm um princípio e um fim”.

 

“A Essência, a Consciência, embutida, engarrafada, acondicionada entre os diversos elementos que constituem o Mim Mesmo, o Ego, desafortunadamente se processa dolorosamente em virtude de seu próprio condicionamento”. “Dissolvendo o Eu, a Essência, a Consciência, desperta, ilumina-se, liberta-se, então ocorre como conseqüência ou corolário, o autoconhecimento ou a autognosis(...)”.

 

“A inteligência, ou Nous, em seu sentido gnosiológico, embora possa servir de embasamento à intelecção iluminada, nega-se rotundamente a cair no vão intelectualismo”.

“São notórias e evidentes as características ontológicas, pneumáticas e espirituais de Nous (Inteligência)”. “Conhecer a si mesmo é ter alcançado a identificação com seu próprio Ser divinal(...)”.homemvitruviano

 

“A experiência gnóstica permite ao sincero devoto conhecer-se e auto-realizar-se completamente”. “Entenda-se por auto-realização o harmonioso desenvolvimento de todas as infinitas possibilidades humanas”. “Não se trata de dados intelectuais caprichosamente repartidos, nem mera conversa ambígua e sem conteúdo(...)”.

“A posse específica da Gnosis vai sempre acompanhada de certa atitude de estranheza frente a este mundo mayávico, ilusório”. “O gnóstico autêntico quer uma mudança definitiva, sente intimamente os secretos impulsos do Ser e daí a sua angústia, rejeição e embaraço diante dos diversos elementos inumanos que constituem o Eu(...)”.

 

“A Gnosis é revelação ou desvelação, aspiração refinada, sintetismo conceitual, máximas aquisições(...)”.

 

Samael Aun Weor

 

Retirado de: http://gnosisportugal.blogspot.com/

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O TANTRISMO E O CULTO À GRANDE MÃE

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Antes da invasão dos povos arianos, a região que eles chamaram de Aryavarta, atual Índia, esta era habitada por um povo de origem atlante que possuíam baixa estatura, pele moreno escura, conhecido como dravidos, sua cultura diferentemente da ariana, baseava-se na agricultura sua religião fundamentava-se no culto a Grande Mãe, sua organização social era o matriarcado.

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Em meio a esse povo, o culto a Grande Deusa, Mãe da natureza, dos deuses e dos homens, era mantido por sacerdotes e sacerdotisas, sendo estas últimas as grandes iniciadoras e Grã mestrinas dos Mistérios da Mãe, conhecidos como Tantrismo. Os adeptos do tantrismos, homens e mulheres, adoravam a Deusa, através de suas inúmeras formas e nomes, Durga a deusa da força, Lakshimi, deusa da beleza e da prosperidade, Sarasvati, Parvati, etc. todas elas expressando suas diferentes características, como projeções num prisma, de um princípio único, arquetípico, que se manifesta de inúmeras formas na face da terra, através de todas as mulheres, ou iniciaticamente falando da hierarquia dos Barishades. As mulheres, materializam através de suas características físicas e psicológicas os diversos aspectos da Divina Mãe.

 


Maha Kâli a Força Cósmica Entre todas as representações da Deusa, no panteon tântrico, sem dúvida nenhuma Kâli, ou Maha Kâli, a deusa negra, nua, exerce um papel central, para o Adepto do Tantrismo que a adora nas profundezas de seu próprio corpo, na escuridão de seu santuário mais sagrado. Porém, para os não iniciados, Kâli apresenta-se como uma figura horrenda, macabra, pois seus aspectos externos foram forjados, ao mesmo tempo para confundir e afastar os profanos e instruir os discípulos, sobre os Arcanos e Mistérios do Culto da Grande Mãe. Ela, Kâli, personifica a força cósmica que devora e destroi as ilusões e a mediocridade dos seres humanos, "Sua ferocidade aparente, só tem igual na verdade metafísica da mensagem de libertação que ela encarna e ensina aos seus fieis" (O Tantrismo - Michel Jean Varenne) Nua e Negra, Kâli não conhece diferenciação, encarnando a pura consciência, impenetrável, despojada das roupagens transitórias, ela se perpetua em meio a escuridão, sem nenhum condicionamento. Feche os olhos e a encontrará, na escuridão de seu próprio corpo. Seus seios generosos, expressão a doçura materna, o afeto instintivo, de uma mãe para com seus filhos, perdidos.

 


O colar de crânios, que ostenta simboliza as letras do alfabeto sânscrito, representando a totalidade do conhecimento, que ela oferece a seus seguidores. Sua basta cabeleira solta, significa a trama que envolve os seres mortais, que condena todos, que não a conhecem ao desaparecimento. Um cinto de mão decepadas, orna-lhe a cintura, para demonstrar que somente Kâli, pode nos livrar dos frutos kármicos, de nossas inumeráveis ações, através do acesso que a pura energia nos dá a consciência cósmica. Seus três olhos, representam o despertar da tríade superior, Atmã, Budhi e Manas que ela promove nos Adeptos. Seus dentes fulgurantes, dourados e sua língua vermelha, personificam a manipulação das energias, sattwica e tamasicas, ou seja, a manipulação do espirito e da matéria, onde o espirito é materializado e a matéria é espiritualizada, no verdadeiro sentido de solve et coagula, ou seja o dissolver e coagular dos alquimistas. Suas duas mãos esquerdas, uma das quais empunham uma espada, afirmam o inevitável extermínio de nossa forma física, animal, e também a destruição dos liames que nos acorrentam à matéria. Suas duas mãos direitas, nos levam a seguir com firmeza e coragem a via espiritual que conduz a libertação interior, a vitória sobre a morte física. Kâli, é a expressão de um Mistério Arcano oculto aos olhos dos não iniciados, que conduz a valores espirituais transcendentes, personifica a força última, constitui a introdução ritual indispensável ao principio da Shakti (energia). As sacerdotisas dravidas, despojavam a Deusa de todas os seus atributos externos, afim de obter a visão da energia impessoal, incondicionada, criadora e destruidora dos mundos. Uma das características dos Adeptos do Tantrismo, é a capacidade de despojar cada acontecimento, quer seja uma sensação física, uma emoção ou um terremoto, para reconhecer a energia, a Shakti, em ação, livre de toda a qualificação moral. A doutrina da Shakti, afirma que o mundo sem dúvida é Maya, ilusão, mas que ele é também a manifestação intempestiva da força, ou da Shakti. Ao invés dos vedantinos e budistas, que posteriormente, dotaram o conceito de Maya de uma interpretação profundamente abstrata e idealista, exacerbando seu aspecto ilusório, os dravidos, ressaltavam seu aspecto de ilusão gerada pela força da manifestação, que cria e destroi simultaneamente, chamando-a de Maya-Shakti, diziam que, "o conceito de força, para que se exerça na Sadhana, na prática, é um guia mais seguro do que a nebulosa idéia de espirito"(Tantra Tatwa). As sacerdotisas ensinavam aos discípulos, através dos símbolismo da dança dos sete véus, os segredos, do desvelamento de Ísis, ou de Maya-Shakti, cada véu representando um aspecto da ilusão que ocultava a força geradora de mundos, plasmadora das formas e doadora da vida. Sendo que ao discípulo é indispensável conhecer a força, afim de libertar-se integralmente de sua rede, sem tal conhecimento da natureza de Maya-Shakti, a libertação que se alcança, não passa da ilusão da libertação. Shakti é a força que transborda criando e destruindo as cegas, Maya é a ilusão da existência dos "eus" distintos do Todo, meros fantasmas criados por esta força, que precisa ser reconduzida a sua origem e reunida a consciência espiritual, ao Purusha. Desde que o Adepto realize nele este princípio, desde que a força extraviadora e extraviada, deixe de diluir-se nos fenômenos, nos fantasmas, na mera procriação de formas cada vez mais inconscientes, então como diz o Kulanarva Tantra, ai então, "o mundo de sansara (o mundo do sofrimento) se torna o próprio lugar de libertação". Maya-Shakti, é compreendida pelos Adeptos, como uma força desgarrada, inconsciente de si mesma, em movimento e em transformação constante, que deve ser conduzida a união com um polo de natureza impassível e serena, para o qual inevitavelmente a força se voltará enfim. Esse polo é Purusha, ou o espirito, impassível ante as manifestações da força reprodutora, reverenciado na figura masculina de Shiva, o impassível, aí então surge a manifestação da divindade andrógina, o deus e sua força, Shiva-Shakti, não mais Maya-Shakti, a força inconsciente geradora de miragens, mas a suprema personificação do divino, Pai-Mãe, Brahma, "a união em nós de Shiva, o impassível, e Shakti a devoradora, provoca a libertação dos fenômenos perturbadores e o gozo da realidade última".

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O Deus vagabundo, andarilho, sem domicílio, dançando nos lugares de cremação, seminu com o corpo untado de cinzas, ornamentado com serpentes, utilizando a meia lua na fronte, que senta-se sobre a pele de tigre, empunhando seu tridente, ou que cavalga o touro, com seus olhos brilhantes sempre alheios a tudo, fixos na eternidade, sem família, sem casta, sem origem, ninguém conhecendo sua idade. Essa divindade masculina, adorada pelos dravidos, representa o espirito absoluto, contemplativo, o modelo arquetípico do Adepto que forma par com a Shakti. Shiva representa a consciência e Shakti a força, ambos devem ser reintegrados. Shiva, é representado no tarô de Marselha, pela figura do louco, ou do Adepto iluminado, que no ritual tântrico, diante do espetáculo embriagador da Shakti, das suculentas iguarias, das mesas guarnecidas de bebidas, da visão exultante de lindas mulheres, deve manter constante lucidez, permanecendo firme, sem se deixar incomodar um minuto sequer pelo toque desenfreado dos sentidos estimulados, participando de tudo, sem temer infringir tabus ancestrais e ao mesmo tempo jamais cedendo às instâncias grosseiras, provocadas pela palpitação dos desejos inferiores. As músicas, as danças, as bebidas, as festas, todos os encantos da Shakti, não são suficientes para desviar o Adepto de seu ideal, ele transubstância organicamente o veneno em néctar da imortalidade, envolvendo-se para se desenvolver, participando sem se perder, ou se diluir, dos mistérios da Deusa, que é são os mistérios da própria vida. Enquanto a Shakti deve ser fisicamente ativa, através das inúmeras formas de sua expressão, Shiva, permanece imóvel, impassível concentrando-se em tudo o que surge, ilumina-se em sua própria consciência. O Adepto que segue o caminho de Shiva, repousa no centro imóvel, onde o tempo e o espaço se diluem, cosmosifica o seu corpo, fazendo com que a força, a Shakti, volte as origens, promovendo a reabsorção de Shakti-Prakriti, em Shiva-Purusha. Deixa de revestir Maya, e ao invés disso realiza a reintegração da essência incriada. O Adepto do Shivaismo, era designado como "morto em vida", pois havia morrido para o mundo, deixando de alimentar ilusões, retirando-se da existência fenomênica, onde nós continuamos a perpetuar-nos às cegas, gerando formas ilusórias cada vez mais inconsciente, numa explosão demográfica que ameaça a existência do próprio planeta. Dessa forma, o que se espalhava cegamente, povoando os mundos, regressa ao seu ponto de origem. Para tanto, o Adepto, deve assimilar, dominar absolutamente a força vital invocada nas manifestações da Shakti, do contrário ela se manifesta sob a forma de uma sede devoradora que nada pode satisfazer, a não ser a morte. Por isso dizem os tantras, que, "todo o praticante que se monstra incapaz de controlar corretamente o desencadeamento de forças provocado pela Shakti, cai vítima de sua influência oculta", vitimado por uma espécie de intoxicação dos sentidos, sofre um dependência passiva e destruidora, que em breve absorverá sua consciência, tornando-se um sátiro, um "demônio", objeto passivo de uma força nefasta, invisível, ou seja, o "tigre", o devorou... A Sadhana ou Prática Tântrica Segundo o culto primitivo dos dravidos, Shiva, a consciência e Shakti, a energia, precisavam se tornar um, essa união, esse casamento místico entre a energia e a consciência, devia fazer-se no corpo do devoto, através de várias práticas, ou sadhanas, que incluíam, os asanas, posturas corporais, o pranayama, controle da respiração, os bandhas, contrações musculares, os mantras, sons mágicos e os yantras, as mentalizações de formas geométricas. O uso combinado desses elementos, objetiva fechar os canais psicossomáticos, reduzindo ao mínimo os desperdícios, promovendo um acumulo de energia, que de outro modo, fluindo por nossas correntes vitais, é desperdiçada no exterior do corpo. As correntes, por onde flui nossa energia vital, se dividem em três modalidades, o pensamento, ligado a Satwa, a respiração ligada a Rajas, e as secreções glandulares, ligados a Tamas. O Sadhaka, ou o praticante da Sadhana, utiliza os mantras para por a energia em movimento, ai então equilibra seu pensamento através da mentalização de yantras, atua sobre o seu fôlego por meio do pranayama e estimula a liberação de suas secreções glandulares utilizando asanas e bandhas. Além das técnicas acima, o praticante deve realizar a vigilância dos sentidos, que promovem divagações e estimulam os apegos aos desejos, a exteriorização, geralmente nossos sentidos agem sem percebermos, induzindo-nos a vários atos automáticos, que prejudicam a harmonia, indispensável a Sadhana Tântrica. Não fazer mal a ninguém, por pensamentos, por palavras ou atos, isso inclui não fazer mal principalmente a si mesmo, não se impondo uma carga ascética suplementar, pois só é capaz de dar amor quem possui amor, como dizia o Adepto Joshua Bem Pandirá, o Jesus bíblico, ama o próximo como a ti mesmo, sendo imprescindível aprendermos a nos amar, a sermos mais compreensivos conosco, a partir desse comportamento, o amor e a compreensão transbordam naturalmente, envolvendo os demais.

 

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Não ser dualista, ou seja evitar a ilusão de que espirito e matéria são distintos, ilusão que se expressa no dia-a-dia através da distinção entre vida material e vida espiritual. Toda nossa vida é espiritual, e toda tipo de existência precisa de alguma forma de invólucro, de matéria mesmo que extremamente sutil. Espirito sem matéria não existe e matéria sem espirito não existe. As melhores técnicas ancestrais, jamais poderão alcançar a fusão unitiva, enquanto o discípulo for vitima dessa cisão ilusória, que expressa uma profunda incapacidade para a via de iluminação oferecida pelo Tantrismo.
A partir da não dualidade o discípulo compreende, outros mistérios da manifestação, principalmente o de que o observador e o observado são um só, percebendo o fenômeno ilusório chamado de projeção pelo Adepto Basílides de Alexandria. Portanto a vida quotidiana do Sadhaka, ou praticante, deve ser centrada, voltada constantemente para o Um, o Ser Eterno, Brahman, pois sem uma atenção firme decidida não dual, absolutamente nada será realizado.

 

 

Por meio desses recursos, o iniciado extingue, a cisão entre a consciência e sua manifestação, produtora da idéia fantasmagórica de um mundo material independente do mundo espiritual e vice-versa. A partir do momento em que o discípulo promove em si, esse casamento místico, a fusão dos verdadeiros gêmeos espirituais, num colóquio amoroso, que exalta a natureza do deus homem, a dualidade religiosa, que opunha espirito a matéria, Purusha a Prakriti, Shiva a Shakti, homem a mulher, evolui para a Unidade Divina, que promove sua iluminação, como ser reintegrado na unidade primordial, pois como dizem os iniciados:

 


só pode haver Um! O Ritual Tântrico O ritual dos dravidos, orientado pelas Mestras do culto da Shakti, punha em movimento as polaridades subjacentes, fundido-as. Dessa forma, o Sadhaka, ou praticante, homem ou mulher, identificava-se com o princípio último, da realidade indiferenciada, Brahman. O conjunto das práticas observadas escrupulosamente cria as condições para que se cumpra esta fusão, do eu individual, com o Eu absoluto. O ritual consiste, portanto, numa mobilização de todas as energias momentaneamente sufocadas ou desviadas, a fim de que elas voltem a se juntar e se coloquem a serviço da LEI, ou seja a serviço da Unidade Primordial. De todos os rituais tântricos o mais transcendente é o chamado Panchamakara, ou como ficou conhecido, o "Rito dos Cinco M". Neste ritual os Adeptos absorvem sucessivamente: o vinho(madya), a carne (mansa), o peixe (matsya), o cereal tostado (mudra) e se entregam a união das polaridades masculinas e femininas (maithuna). A cerimônia dos Cinco M, é em essência um rito de purificação, em cuja a realização não devem se aplicar de maneira nenhuma os discípulos ainda prisioneiros dos prazeres sensuais, incapazes de controlar a respiração, suscetíveis de ceder à cobiça e a embriaguez. Os detalhes operacionais do Panchamakara, o modus-operandi, são preservados pelo selo do segredo, com o intuito de evitar sua profanação por seres despreparados e movidos por seus baixos instintos, que acabariam sendo tragados pelas energias que inconseqüentemente invocaram. O Sadhaka (praticante), através do Ritual Panchamakara, utilizando os Mantras, os Yantras, Pranayama, os Asanas e os Bandhas, realiza:

 

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•    A chamada das energias dissipadas;
•    A reoquestração progressiva destas energias em torno de um centro invisível;
•    A fusão e a subida da energia à fonte de onde ela emanou;
•    A transfiguração da força em seu princípio.
•    O que promove, progressivamente, a iluminação do Adepto, que se funde a luz original.

 


Os estágios acima, integrados no Ritual, segundo as qualidades individuais do praticante, promovem num espaço de tempo, mais curto ou mais longo, a recentragem que preludia a realização máxima e final. "O ritual coloca o Sadhaka no centro do processo criador, na perspectiva de uma reabsorção completa dessa criação".

 


As características do Adeptos A compreensão do Tantrismo, do culto da Grande Mãe, exige uma qualidade essencial do discípulo, sejam eles homens ou mulheres, exige que eles possuam oja, ou virya, a virilidade. Somente a virilidade garante uma prática, ou Sadhana, real e eficaz. O mestre que nos esclareceu melhor sobre o significado do termo virya foi Sri. Abhivanagupta, quando afirma que "Não ter virilidade é não ter vida, é não ter a faculdade de se maravilhar..."

 


O Adepto do Tantrismo, está destinado a se abismar na força, "condenado" a lutar com o tigre, a vencer ou perecer. Sua força interior depende menos da coragem que do fervor, do amor exclusivo pela Shakti, manifestada pela expressão da Deusa no mundo...
Mas como o fogo no altar da Deusa, Maya-Shakti, sempre foi mantido aceso pelas sacerdotisas, estas mais do que ninguém, precisam ser portadoras de determinadas características, tais como a capacidade de experimentar um completo abandono à Energia Cósmica, sem restrição mental ou física, fazendo dádiva de sua pessoa com fervor e amor. Esse amor não deve ser confundido com desejo e sentimento de posse, com ciúme, pieguismos, etc. Esses sentimentos inferiores podem levar-nos as maiores loucuras, porém são incapazes de conduzir-nos a iluminação interior, ao despertar da vida interna e a libertação da morte. A receptividade aos desígnios da Deusa , da Anima Mundi e a expressão do amor fraternal são condições imprescindíveis para a sacerdotisa tântrica. Sua generosidade encerra um poder incalculável, uma reserva energética inexaurível, que convenientemente dirigidos, promovem a libertação da ignorância e a iluminação. O amor é a chave da iluminação, o verdadeiro amor, que é caracterizado pelo despertar do chacra cardíaco. Somente podemos dar aquilo que possuímos, portanto somente uma sacerdotisa, que possua este centro de força vibrando, mesmo que parcialmente, pode fazer vibrar em uníssono, o centro cardíaco daquele que busca a iluminação, somente ela pode ser investida dos poderes ilimitados da Shakti. O Papel do Tantrismo na Época Contemporânea O Tantrismo poderíamos concluir, apesar de ser uma doutrina das mais antigas, está plenamente adaptado à época em que vivemos, época conhecida como Kali-Yuga ou Idade Negra. Neste período em que a energia encontra-se completamente extraviada na matéria, adormecida e inconsciente, os Adeptos Tântricos, partindo da premissa que durante as crises a energia vital desperta com maior intensidade, utilizam tudo aquilo que poderíamos encarar como obstáculo, como perigo para ativar nossos recursos psico-fisiológicos, afim de que uma vez desperta, a energia possa ser canalizada para seus sete centros de força, colocando-os em atividade para promover sua iluminação interior .

 

 

Dessa forma, convertem o veneno em néctar da imortalidade da consciência, numa empreitada perigosa, pois muitos que, friccionando a lâmpada e fazendo sair dela o gênio, acabaram convertendo-se de amo e senhor, em serviçais das forças que não foram capazes de dominar.
Tal realização só pode ser levada a cabo sobre a tutela amorosa e misericordiosa dos Arquétipos divino Shiva-Shakti, ou em linguagem mística, só podem realizá-la aqueles que forem abençoados pela Divindade, que os guardará em suas inevitáveis quedas, abrindo ou mantendo seladas "as Portas de Ouro que nos livram da Deusa Maya", de acordo com a capacidade e o progresso de cada discípulo na Senda da iniciação.

 


Pensamento
"Pelos mesmos atos que fazem certos seres arderem no inferno, os Adeptos obtém a libertação suprema."

 

Postado por FR Gemini 21.’.

(Retirado de algum blog que não lembro)

domingo, 11 de setembro de 2011

À Procura de Iranon (H.P. Lovecraft)

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Para a cidade de granito de Teloth perambulou o jovem com uma grinalda de folhas de parreira sobre o cabelo louro reluzente de mirra, o manto púrpura rasgado pelos espinheiros do monte Sidrak, que se ergue do outro lado da antiga ponte de pedra. Os homens de Teloth são rudes e sombrios, e moram em casas quadradas. Com semblantes carrancudos perguntaram ao estrangeiro de onde ele vinha e qual era seu nome e fortuna. E o jovem respondeu:

"Sou Iranon e venho de Aira, uma cidade distante da qual só me lembro vagamente mas que procuro reencontrar. Sou um cantor das canções que aprendi na cidade distante e meu oficio é fazer beleza com as coisas relembradas da infância. Minha riqueza está em pequenas lembranças e sonhos, e nas esperanças que canto nos jardins quando a lua é doce e o vento oeste agita as flores de lótus".

Quando os homens de Teloth ouviram essas coisas, murmuraram entre si; pois, embora na cidade de granito não haja risos nem canções, os homens rudes às vezes olham para os montes Karthianos, na primavera, e pensam nos alaúdes da distante Oonai mencionada pelos viajantes. E, assim pensando, pediram ao estrangeiro que ficasse e cantasse na praça diante da Torre de Mím, embora não gostassem da cor de seu manto esfarrapado, nem da mirra em seu cabelo, nem de sua grinalda de folhas de videira, nem da juventude de sua voz dourada. Ao anoitecer, Iranon cantou, e enquanto cantava um velho orava e um cego afirmou enxergar uma auréola sobre a cabeça do cantor. Mas a maioria dos homens de Teloth bocejou, e alguns riram, e alguns caíram no sono, pois Iranon não dizia nada de útil, cantando somente suas lembranças, seus sonhos e suas esperanças. "Lembro-me do crepúsculo, da lua e das doces canções, e da janela onde era embalado para dormir. E além da janela havia a rua de onde vinham as luzes douradas e as sombras dançavam sobre casas de mármore. Recordo o quadrado de luar do chão, que nenhuma outra luz igualava, e as visões que dançavam nos raios lunares quando minha mãe cantava para mim. E recordo também o sol da manhã brilhando sobre as multicoloridas colinas no verão, e a doçura das flores carregadas pelo vento sul que fazia as árvores cantarem." "Ó Aira, cidade de mármore e berilo, quantas não são tuas belezas! Quanto eu amava os cálidos e fragrantes bosques além do hialino Nithra, e as quedas do minúsculo Kra, que corria pelo vale verdejante! Naqueles bosques e naquele vale, as crianças trançavam grinaldas umas para as outras e, ao crepúsculo, eu sonhava estranhos sonhos sob as árvores yaths na montanha enquanto via, abaixo de mim, as luzes da cidade e o sinuoso Nithra refletindo um cinturão de estrelas." "E na cidade havia palácios de mármore raiado e matizado com cúpulas douradas e paredes ornamentadas, e verdes jardins com tanques cerúleos e fontes cristalinas. Muitas vezes brinquei nos jardins, e entrei nos tanques, e me deitei e sonhei entre as pálidas flores debaixo das árvores. E às vezes, ao pôr-do-sol, eu subia pela longa e íngreme rua até a cidadela e a praça aberta, e olhava para baixo, para Aira, a cidade mágica de mármore e berilo, esplêndida em seu manto de chama dourada." "Há muito eu te perdi, ó Aira, pois era muito jovem quando parti para o exílio, mas meu pai era o Rei e eu voltarei para ti, pois assim quer o Destino. E por sete terras eu te busquei, e algum dia reinarei sobre teus bosques e jardins, tuas ruas e palácios, e cantarei para homens que saberão do que eu canto, e não rirão, nem se afastarão. Pois eu sou Iranon, que foi um Príncipe em Aira." Naquela noite, os homens de Teloth alojaram o estrangeiro num estábulo e, pela manhã, um arconte foi ter com ele dizendo-lhe para ir à oficina de Athok, o sapateiro, e tornar-se seu aprendiz. "Mas eu sou Iranon, um cantor de canções", disse ele, "e não tenho vocação para o oficio de sapateiro." "Todos em Teloth devem trabalhar arduamente", replicou o arconte, "pois esta é a lei." Então disse Iranon: "Por que motivo trabalhais arduamente? Não deveis viver e ser felizes? E se trabalhais arduamente apenas para poder trabalhar ainda mais, quando a felicidade vos encontrará? Trabalhais para viver, mas a vida não é feita de beleza e canção? E se não tiverdes cantores entre vós, para onde irão os frutos de vosso trabalho? A lida sem canção é como uma jornada estafante sem um fim. A morte não seria mais agradável?" Mas o arconte se aborreceu e não entendeu, e reprovou o estranho. "És um jovem estranho e não gosto de teu rosto, nem de tua voz. As palavras que falas são blasfêmia, pois disseram os deuses de Teloth que o trabalho árduo é bom. Nossos deuses nos prometeram um paraíso de luz além da morte onde repousaremos eternamente, e a frialdade de cristal em meio à qual ninguém perturbará nossa mente com pensamentos ou nossos olhos com beleza. Vai, pois, até Athok, o sapateiro, ou parte da cidade ao entardecer. Todos aqui devem servir, e cantar é insensatez." Iranon abandonou então o estábulo e caminhou pelas estreitas ruas de pedra entre as sombrias casas quadradas de granito, procurando algum verde, pois tudo ali era de pedra. Os homens traziam as testas franzidas, mas no dique de pedra que margeava o preguiçoso rio Zuro havia um garoto sentado escrutinando com olhos tristes as águas por trás de verdes ramos floridos trazidos dos morros pelas cheias. E o garoto lhe disse: Não és aquele de quem os arcontes falam, aquele que procura uma cidade distante numa bela região? Sou Romnod, nascido do sangue de Teloth, mas não sou um velho calejado nos modos da cidade de granito e anseio diariamente pelos cálidos bosques e as terras distantes de beleza e canção. Além dos montes Karthianos fica Oonai, a cidade dos alaúdes e das danças da qual os homens murmuram dizendo que é igualmente adorável e terrível. Ali eu iria se fosse suficientemente velho para encontrar o caminho, e ali deverias ir e cantar, e terias pessoas para te escutar. Deixemos a cidade de Teloth e viajemos juntos entre os montes primaveris. Tu me mostrarás os caminhos da viagem e eu ouvirei tuas canções ao entardecer, quando as estrelas, uma a uma, trazem sonhos às mentes dos sonhadores. E pode mesmo acontecer que Oonai, a cidade dos alaúdes e das danças, seja a mesma bela Aira que tu procuras, pois conta-se que não encontraste Aira desde os velhos tempos, e os nomes freqüentemente mudam. Vamos para Oonai, ó Iranon de cabeça dourada, onde os homens conhecerão nossos anseios e nos receberão como irmãos, e também não rirão nem franzirão as testas com o que dissermos". E Iranon respondeu: "Assim seja, pequeno. Se alguém neste lugar de pedra anseia por beleza, deve buscar as montanhas e ir além delas, e eu não te deixaria a definhar ao lado do preguiçoso Zuro. Mas não penses que o deleite e o entendimento grassam logo depois dos montes Karthianos, ou em qualquer lugar que possas encontrar numa jornada de um dia, ou um ano, ou um lustro. Olha, quando eu era pequeno como tu, morava no vale de Narthos, à beira do frígido Xari, onde ninguém se importava com meus sonhos, e disse para mim que, quando fosse mais velho, iria para Sinara na encosta meridional, e cantaria para sorridentes cameleiros na praça do mercado. Mas quando fui a Sinara, encontrei os cameleiros todos bêbados e dissolutos, e percebi que suas canções não eram como as minhas, por isso viajei numa chata, descendo o Xari até a Jaren das muralhas de ônix. E os soldados de Jaren riram de mim e me expulsaram, por isso saí perambulando por muitas outras cidades. Conheci Stethelos, abaixo da grande catarata, e vi o pântano onde um dia existiu Sarnath. Estive em Thraa, Ilarnek e Kadatheron às margens do sinuoso rio Ai, e habitei muito tempo Olathoe, na terra de Lomar. Mas, embora encontrasse ouvintes ocasionais, eles sempre foram muito poucos, e sei que só serei bem recebido em Aira, a cidade de mármore e berilo onde meu pai uma vez governou como Rei. Assim, pois, buscaremos Aira, embora fosse bom visitar até a distante Oonai, abençoada pelos alaúdes, além dos montes Karthianos, que pode de fato ser Aira, muito embora eu não o creia. A beleza de Aira supera a imaginação e ninguém consegue se pronunciar sobre ela sem arrebatamento, enquanto de Oonai os cameleiros sussurram furtivamente."

O sol se punha, quando Iranon e o pequeno Romnod partiram de Teloth, e durante muito tempo perambularam pelos verdes montes e as frias florestas. O caminho era acidentado e escuro, e eles pareciam nunca se aproximar de Oonai, a cidade de alaúdes e danças, mas quando chegava o crepúsculo e as estrelas surgiam, Iranon cantava sobre Aira e suas belezas, e Romnod escutava, e isso os deixava, até certo ponto, contentes. Comiam regaladamente frutas e bagas vermelhas, e não sentiam o tempo passar, mas muitos anos devem ter transcorrido. O pequeno Romnod já não era tão pequeno e já não tinha a voz esganiçada e sim grave, embora Iranon fosse sempre o mesmo e continuasse enfeitando seus cabelos dourados com folhas de parreira e resinas fragrantes encontradas nos bosques. Assim, deu-se um dia em que Romnod pareceu estar mais velho que Iranon, embora fosse muito pequeno quando Iranon o encontrara espreitando por verdes ramos floridos em Teloth, ao lado do preguiçoso Zuro margeado de pedra. Era uma noite de lua cheia quando os viajantes atingiram o cume de uma montanha e, olhando para baixo, avistaram as miríades de luzes de Oonai. Camponeses lhes haviam dito que estavam perto e Iranon percebeu que aquela não era sua cidade nativa de Aira. As luzes de Oonai não eram como as luzes de Aira, pois eram fortes e ofuscantes, enquanto as luzes de Aira brilhavam com tanta suavidade e magia quanto o luar sobre o chão ao lado da janela onde a mãe de Iranon um dia o acalentara com canções. Mas Oonai era uma cidade de alaúdes e danças, por isso Iranon e Romnod desceram a íngreme encosta para encontrar pessoas a quem canções e sonhos pudessem agradar. E, quando entraram na cidade, encontraram foliões com grinaldas de rosas saltitando de casa em casa e se inclinando de janelas e sacadas que ouviam as canções de Iranon e atiravam-lhe flores e o aplaudiam quando terminava. Então, por um momento, Iranon acreditou ter encontrado os que pensavam e sentiam como ele, embora a cidade não tivesse um centésimo da beleza de Aira. Ao chegar a aurora, Iranon olhou em torno desalentado, pois as cúpulas de Oonai não eram douradas sob o sol, mas cinzentas e sombrias. E os homens de Oonai estavam pálidos das folias e entorpecidos pelo vinho, e eram diferentes dos radiantes homens de Aira. Mas como as pessoas tinham atirado flores sobre ele e aclamado suas canções, Iranon ficou, e com ele Romnod, que gostava das folias da cidade e trazia rosas e mirto em seus negros cabelos. Muitas vezes, à noite, Iranon cantava para os foliões, mas estava sempre como antes, coroado apenas com as vinhas das montanhas e recordando as ruas de mármore de Aira e o hialino Nithra. Nos salões cobertos de afrescos do Monarca ele cantou sobre uma plataforma de cristal elevada sobre um piso espelhado, e ao cantar trazia imagens para seus ouvintes até o piso parecer refletir coisas antigas, belas e meio lembradas em vez dos foliões avermelhados pelo vinho que o bombardeavam com rosas. E o Rei pediu-lhe que tirasse seu esfarrapado manto púrpura e vestiu-o de cetim com brocados de ouro, com anéis de jade verde e braceletes de tinto marfim, e alojou-o num quarto dourado e forrado de tapeçarias com uma cama de madeira delicadamente entalhada, com dosséis e colchas de seda com bordados florais. Assim viveu Iranon em Oonai, a cidade dos alaúdes e das danças. Não se sabe quanto tempo Iranon permaneceu em Oonai, mas certo dia o Rei trouxe para o palácio alguns dançarmos frenéticos do deserto liraniano e trigueiros flautistas de Drinen, no Leste, e a partir de então os foliões atiraram suas rosas não tanto em Iranon, mas sobretudo nos dançarinos e flautistas. E, dia após dia, aquele Romnod que havia sido um garoto na granítica Teloth foi se tornando mais rude e avermelhado pelo vinho, até que passou a sonhar cada vez menos e a ouvir com menos deleite as canções de Iranon. Mas, embora estivesse triste, Iranon não deixava de cantar, e à noite recontava sempre seus sonhos de Aira, a cidade de mármore e berilo. Então, certa noite em que roncava pesadamente recostado entre as sedas narcóticas de seu leito, Romnod, gordo e rubicundo, faleceu em meio a uma convulsão, enquanto Iranon, pálido e esbelto, cantava para si mesmo num canto distante. Depois de prantear sobre o túmulo de Romnod e o forrar com verdes ramos floridos como os que Romnod costumava amar, Iranon despiu suas sedas e adornos e partiu, esquecido, de Oonai, a cidade de alaúdes e danças, trajando apenas o esfarrapado manto púrpura com que chegara, coroado com uma grinalda de frescas folhas de parreira das montanhas. Ao entardecer, errava ainda Iranon, procurando sua terra nativa e os homens que compreenderiam e louvariam seus sonhos e canções. Em todas as cidades de Cydathria e nas terras além do deserto de Bnazie, crianças risonhas riam de suas velhas canções e de seu esfarrapado manto púrpura, mas Iranon permanecia jovem e trazia grinaldas sobre sua cabeça dourada enquanto cantava sobre Aira, deleite do passado e esperança do porvir. Assim foi que chegou, certa noite, ao esquálido casebre de um velho pastor, encurvado e sujo, que apascentava rebanhos numa encosta empedrada que subia de um pântano de areias movediças. Para esse homem, falou Iranon, como para tantos outros havia falado: "Podeis me dizer onde poderei encontrar Aira, a cidade de mármore e berilo, onde corre o hialino Nithra, e onde as quedas do minúsculo Kra cantam para vales verdejantes e colinas cobertas de pés de yath?" E o pastor, ouvindo, olhou demorada e atentamente para Iranon, como que recordando algo muito distante no tempo, e observou cada linha do rosto do estranho, e seu cabelo dourado, e sua coroa de folhas de videira. Mas ele era velho e abanou a cabeça enquanto respondia: "Ó estrangeiro, ouvi de fato o nome de Aira, e os outros nomes de que falaste, mas eles me vêm de muito longe, da profundeza de longos anos. Ouvi-os em minha juventude dos lábios de um companheiro de folguedos, o filho de um mendigo dado a estranhos sonhos que tecia longas narrativas sobre a lua e as flores e o vento oeste. Costumávamos rir dele, pois o conhecíamos desde seu nascimento, embora pensasse ser filho de um Rei. Era gracioso, como tu, mas cheio de disparates e estranheza; e fugiu quando era pequeno para encontrar os que ouviriam com deleite seus sonhos e canções. Quantas vezes não cantou ele para mim sobre terras que nunca existiram e coisas que nunca existirão! De Aira ele falava muito; de Aira e do rio Nithra, e das quedas do minúsculo Kra. Ele sempre dizia que ali vivera algum dia como um Príncipe, embora por aqui nós o conhecêssemos desde seu nascimento. Jamais existiu uma cidade de mármore de Aira, nem os que poderiam se deleitar com estranhas canções exceto nos sonhos de meu velho companheiro de folguedos Iranon, que partiu". E ali, ao crepúsculo, quando as estrelas saiam uma a uma e a lua lançava sobre o pântano uma radiância como a que uma criança vê estremecer no piso enquanto é ninado ao anoitecer, caminhou em direção à areia movediça letal um homem muito velho vestindo um esfarrapado manto púrpura, coroado com folhas ressecadas de videira e olhando para a frente como se estivesse vendo as cúpulas douradas de uma bela cidade onde os sonhos são compreendidos. Naquela noite, algo de juventude e beleza morreu no velho mundo.