segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

PSICOLOGIA DA EVOLUÇÃO POSSÍVEL AO HOMEM

 

ouspensky1

O  trecho abaixo é do livro  PSICOLOGIA DA EVOLUÇÃO POSSÍVEL AO HOMEM, do psicólogo e filósofo russo P. D. Ouspensky.

 


“O que é a consciência? Na linguagem comum, a palavra “consciência” é quase sempre empregada como equivalente da palavra “inteligência”, no sentido de atividade mental.

 


Na realidade, a consciência no homem é uma espécie muito particular de “tomada de conhecimento de si mesmo”, conhecimento de  quem ele é, de onde está e, a seguir, conhecimento do que sabe, do que não sabe, e assim por diante.

 


Só a própria pessoa é capaz de saber se está consciente ou não em dado momento. Certa corrente de pensamento dá psico­logia européia provou, aliás, há muito tempo, que só o próprio homem pode conhecer certas coisas sobre si mesmo. Só o próprio homem, pois, é capaz de saber se a sua consciência existe ou não, em dado momento. Assim, a presença ou a ausência de consciência no homem não pode ser provada pela observacão de seus atos exteriores. Como acabo de dizer, esse fato foi estabelecido há muito, mas nunca se compreendeu real­mente sua importância, porque essa idéia sempre esteve ligada a uma compreensão da consciência como atividade ou processo mental.

 


O homem pode dar-se conta, por um instante, de que, antes desse mesmo instante, não estava consciente; depois, esquecerá essa experiência e, ainda que a recorde, isso não será a consciência. Será apenas a lembrança de uma forte experiência.

 


Quero, agora, chamar-lhes a atenção para outro fato per­dido de vista por todas as escolas modernas de psicologia.

 


É o fato de que a consciência no homem jamais é permanente, seja qual for o modo como é encarada. Ela está presente ou está ausente. Os momentos de consciência mais elevados criam a memória. Os outros momentos, o homem simplesmente os esquece. É justamente isso que lhe dá, mais que qualquer outra coisa, a ilusão de consciência contínua ou de “percepção de si” contínua.

 


Algumas modernas escolas de psicologia negam inteira­mente a consciência, negam até a utilidade de tal termo; isso, porém, não passa de paroxismo de incompreensão. Outras escolas, se é possível chamá-las assim, falam de “estados de consciência”, quando se referem a pensamentos, senti­mentos, impulsos motores e sensações. Tudo isso tem como base o erro fundamental de se confundir consciência com funções psíquicas.

 


Na realidade, o pensamento moderno, na maioria dos casos, continua a crer que a consciência não possui graus. A aceitação geral, ainda que tácita, dessa idéia, embora em contradição com numerosas descobertas recentes, tornou impossível muitas observações sobre as variações da consciência. O fato é que a consciência tem graus bem visíveis e observáveis, em todo caso visíveis e observáveis por cada um em si mesmo.

 


Primeiro, há o critério da duração: quanto tempo se permanece ­consciente?

 


Segundo, o da freqüência: quantas vezes se tornou consciente?
Terceiro, o da amplitude e da penetração: do que se estava consciente? Pois isso pode variar muito com o crescimento inte­rior do homem.

 


Se considerarmos apenas os dois primeiros desses três pon­tos, poderemos compreender a idéia de uma evolução possível da consciência. Essa idéia está ligada a um fato essencial, perfeitamente conhecido pelas antigas escolas psicológicas, tais como a dos autores da Philokalia, porém completamente ignorado pela filosofia e pela psicologia européias dos dois ou três últimos séculos.
É fato que por meio de esforços especiais e de um estudo especial a pessoa pode tornar a consciência contínua e controlável.

 


Tentarei explicar como a consciência pode ser estudada. Tome um relógio e olhe o ponteiro grande, tentando manter a percepção de si mesmo e concentrar-se no pensamento “eu sou Pedro Ouspensky”, por exemplo, “eu estou aqui neste momen­to”. Tente pensar apenas nisso, siga simplesmente o movimento do ponteiro grande, permanecendo consciente de si mesmo, de seu nome, de sua existência e do lugar em que você está. Afaste qualquer outro pensamento.

 


Se for perseverante, poderá fazer isso durante dois minutos. Tal é o limite da sua consciência. E se tentar repetir a experiên­cia logo a seguir, irá achá-la mais difícil que da primeira vez.

 


Essa experiência mostra que um homem em seu estado normal pode, mediante grande esforço, ser consciente de uma coisa (ele mesmo) no máximo durante dois minutos. A dedução mais importante que se pode tirar dessa expe­riência, se realizada corretamente, é que o homem não é consciente de si mesmo. Sua ilusão de ser consciente de si mesmo é criada pela memória e pelos processos do pensamento.
Por exemplo, um homem vai ao teatro. Se tem esse hábito, não tem consciência especial de estar ali enquanto ali está. E, não obstante, pode ver e observar; o espetáculo pode interessá-lo ou aborrecer-lhe; pode lembrar-se do espetáculo, lembrar-se das pessoas com quem se encontrou, e assim por diante. De volta à casa, lembra-se de haver estado no teatro e, naturalmente, pensa ter estado consciente enquanto lá se encontrava. De forma que não tem dúvida alguma quanto à sua cons­ciência e não se dá conta que sua consciência pode estar totalmente   ausente mesmo quando ele ainda age de modo razoável, pensa observa.

 


De maneira geral, o homem pode conhecer quatro estados de  consciência, que são: o sono, o estado de vigília, a consciência de si e a consciência objetiva.

 


Mesmo tendo a possibilidade de conhecer esses quatro esta­dos de consciência, o homem só vive, de fato, em dois desses estados: uma parte da sua vida transcorre no sono e a outra, só que se chama de “estado de vigília”, embora, na realidade, esse último difira muito pouco do sono.

 


Na vida comum o homem nada sabe da “consciência objetiva” e não pode ter nenhuma experiência dessa ordem. O homem se atribui o terceiro estado de consciência, ou “consciência de si e crê possuí-lo, embora na realidade, só seja consciente de si mesmo por lampejos, aliás muito raros; e, mesmo nesses momentos, é pouco provável que reconheça esse estado, dado que ignora o que implicaria o fato de realmente possuí-lo.

 


Esses vislumbres de consciência ocorrem em momentos excepcionais, em momentos de perigo, em estados de intensa emoção, em circunstâncias e situações novas e inesperadas, ou também, às vezes, em momentos  bem simples onde nada de particular ocorre. Em seu estado ordinário ou “normal”, porém, o homem não tem qualquer controle sobre tais momentos de consciência.

 


Quanto à nossa memória ordinária ou aos nossos momentos de memória, na realidade, nós só nos recordamos de nossos momentos de consciência, embora não saibamos que isso é assim.

 


O que significa a memória no sentido técnico da palavra ?  Notarão que não se recordam das coisas  sempre da mesma maneira. Algumas coisas são recordadas de forma muito viva, outras permanecem vagas e existem aquelas de que não se recordam em absoluto. Sabem apenas que aconteceram.

 


Ficarão muito surpresos quando constatarem como se re­cordam de pouca coisa, E é assim, porque só se recordam dos momentos em que estiveram conscientes.

 


Assim, para voltar a esse terceiro estado de consciência, podemos dizer que o homem tem momentos fortuitos de consciência de si, que deixam viva lembrança das circunstâncias que eles ocorreram. O homem, entretanto, não tem nenhum poder sobre tais momentos. Aparecem e desaparecem por si mesmos, sob a ação de condições exteriores, de associações aci­dentais ou de lembranças de emoções.
Surge esta pergunta: é possível adquirir á domínio desses momentos fugazes de consciência, evocá-los mais freqüentemente, mantê-los por mais tempo ou, até, torná-los permanentes?

 


Em outros termos, é possível tornar-se consciente? Esse é o ponto essencial e é preciso compreender, desde o inicio do nosso estudo, que esse ponto escapou completamente, até em teoria, a todas as escolas modernas de psicologia, sem exceção.

 


De fato, por meio de métodos adequados e esforços apro­priados, o homem pode adquirir o controle da consciência, pode tornar-se consciente de si mesmo, com tudo o que isso implica. Entretanto, o que isso implica não podemos sequer imaginá-lo em nosso estado atual. Só depois de bem compreendido esse ponto, é possível empreender um estudo sério da psicologia.”

Um comentário:

  1. a primeira expressao da consciencia é saber qe nao se é consciente!! Ouspensky deixa claro isso com sua maravilhosa exposicao!

    ResponderExcluir